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sábado, 22 de maio de 2010

Promessas: não vendemos fiado

Eu não me arrependo de não me lembrar como é sentir. Ou de não saber o que aconteceu. Acho que uma fraqueza é como um tiro no escuro, você sente dor, mas não sabe porque aquilo te atingiu. Como um tiro no peito. A dor se difunde de maneira tão incoerente, que implorar pra que ela acabe, é algo natural. Estancar o sangue, ou simplesmente deixá-lo escorrer até não restar uma gota.
Quando acaba, é pra valer, não é? A gente acaba se lembrando das coisas que a gente não fez. E se arrependendo de disparates que acabamos por cometer. Pensando em tudo aquilo que a gente não disse para alguém especial. Um abraço não tão apertado, uma palavra que escapuliu. Um sentimento que foi arrastado e outro que não se tolerou existir. E que agora não se pode voltar atrás.
Não quero que você se desculpe, ou que volte por se sentir forçada. Mas, e então? Isto é tudo que a gente pode fazer? Está tudo tão acabado. E enquanto escuto os aplausos e pessoas gritando meu nome enquanto eu seguro meu antigo violão, me lembro que quando você estiver lendo isto, eu já terei partido há muito. A questão é que você só desaponta aqueles que você acredita. A questão é que, meu amor, meu sangue está frio. Não há mais adrenalina correndo minhas veias. Não há brasa, pois não há paixão.
Enquanto eu a beijo, meus olhos fechados apertados temem que você corra. Mas isso já aconteceu.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Capitulo Quatro - Devaneios jovens, jovens devaneios.

Rio de Janeiro, 20 de novembro de 1985, Quarta- Feira.

Desvendei o mundo num quarto de ajudante doméstica em uma festa muito louca. Estávamos nós, ali, entre um amasso e outro, num arranca suspiro de um lado e aperta coxa de outro, e aconteceu. Não precisamente da maneira que eu esperava, pois foi algo absurdamente maior do que eu -em algum dia da minha vida- pudesse imaginar. Seu calor me devolveu a vida, ou melhor, me apresentou a ela. Amei ter podido dividir com você o momento mais pessoal que tivera comigo mesmo. Eu te amo, minha princesa.

15:03



Atirados na cama estávamos. Aquela era a minha cama. Olhei para o relógio, 9h. Tinha que trabalhar! Estava zonzo e ainda sem entender porque estávamos ali. Revirei a minha mesa de estudo a procura de uma caneta, pois queria escrever um bilhete para Julia avisando-a de ela deveria se sentir em casa enquanto eu trabalhava. Vi o calendário e graças ao bom Deus, era feriado. Agradeci umas duzentas vezes por não ter que ir ao hospital com essa cara péssima e uma ressaca apavorante. Voltei a me deitar, bem ao lado dela. Podia sentir sua respiração encostando meu rosto que se posicionava numa distancia ínfima do seu. E aquilo me satisfazia de uma maneira intrigante. Sua respiração me bastava, não era preciso nem roubar um beijo dela. Voltei a dormir, pois estava tranqüilo: ela se deitara em meus braços.
Senti uma respiração densa perto da minha: ele dormia pesadamente. Beijei sua testa e minha boca esteve colada em sua pele por alguns instantes. Seus olhos cinza de repente me afrontaram e aquilo me levou a um estado de espírito que até então eu nunca sentira. Beijei sua bochecha e sua mão de veludo tocou as raízes dos cabelos da minha nuca. Beijei sua boca. Beijei como uma criança, suando frio. Meus olhos se fecharam apertados e me dei conta de que durante anos desperdicei dezenas de milhões de beijos em pessoas que nunca significaram nada pra mim. Aquilo era um beijo, pois aquele hálito matinal me traria nojo na maioria dos casos, mas naquele, especificamente, me deu prazer, descanso e serenidade. Aquilo era o tal beijo que tanto eu sentia a ausência, que eu tanto cobiçava, que eu busquei em outras pessoas durante tanto tempo, em vão.
O toque de seus lábios macios me despertou de vez em um segundo. Eu estava pronto! Pronto para receber de novo tudo aquilo que deixara fugir pelos meus dedos num momento alucinado. Segurei sua cintura – que tinha curvas indescritíveis- e a posicionei de modo agradável. Vi um sorriso no canto de sua boca enquanto me beijava. Nunca sentira tanto amor envolvido num simples beijo. Ele não era simples! Ele era eu, ela e minha vida. Ele era tudo que tivera de extraordinário e seguro até aquele instante. A euforia tomou conta de nossos corpos e de repente aquele parecia um assunto para ser resolvido urgentemente para os dois. Afinal, há quanto tempo nossos corpos não se uniam a qualquer outro com tanta intensidade?
As roupas foram atiradas pelo quarto, que já estava bagunçado. Mas, de verdade, sabe o que estava de mais bagunçado naquele momento? Meu coração. Pois ele – ele mesmo, o fraco – disparou. Senti seu corpo se juntar ao meu, como se aquilo fosse a parte que faltasse, como se aquele fosse um membro que me fora retirado, mas que eu ainda pudesse sentir. E, o que eu poderia fazer naquela hora, a não ser amar? Amar loucamente, eu digo. E me entregar também, inteiramente. De corpo e alma, em seu sentido literal.
- Eu te amo, Júlia.
- E eu te odeio.
- É mesmo, senhorita? E posso saber o motivo?
- Te odeio pelo fato de você nunca ter conseguido me amar.
- Mas eu te amo!
- Não é porque fizemos amor, que você me ama! Michel, você vai se levantar, colocar sua roupa, preparar um café da manha, nós vamos comer e pronto. Acabou, até daqui a 20 anos! Você vai fingir que nada nunca aconteceu. Ou vai simplesmente encarar isso como uma simples transa e, Michel, eu não vou. Sou eu quem vai passar a tarde pensando em como eu gostaria que seu corpo tocasse o meu todos os dias de manha e quem vai desejar desesperadamente te encontrar por acaso em uma banca de jornal!
- Meu Deus, Júlia, pare de falar bobagens!
- Michel, você sabe que é verdade!
- Então, tá, já que você se sente mais feliz assim, então eu não te amo.
- Sim, então me responde: quando você vai aprender a me amar?
- Quanto eu te perder pra sempre.
Não havia percebido o porquê daquilo tudo. Por que Julia duvidava tanto de meu amor por ela? Por que para mim, de alguma forma, aquilo poderia fazer algum sentido? Demorei alguns minutos para tirar uma conclusão. Achei que a amasse, não duvidara disso até certo momento. Por que duvidaria, se afinal, a amasse de verdade? Se sim, então não amava. Confundi-me nas minhas próprias teses e argumentos. Afoguei-me na minha duvida e nela, criei um novo espaço em branco dentro de mim. Será que me iludira naqueles 3 dias, somente por estar me sentindo deserto? Não seria egoísmo de a minha parte ridicularizar o sentimento de alguém?
Peguei minhas coisas e antes mesmo de fazer o desjejum, fui embora. Peguei um taxi – já que deixara meu carro estacionado no bar – e fui até a praia de Ipanema. Sentei em um quiosque, e pedi uma cerveja e um cigarro a varejo. Observei a praia e as pessoas que faziam uma caminhada no calçadão. Nunca gostei de praia, justamente por ser branca demais. Nem de bebida, nem de cigarro. Acostumei-me a adorar, pois ele gostava. Ele sempre ia à praia cedo e ficava até o pôr-do-sol. Batia palmas quando o sol se ocultava atrás dos morros. Tomava sua cerveja gelada e queimava seu cigarro, enquanto eu lia uma revista sobre Nelson Rodrigues. “O amor bem-sucedido não interessa a ninguém!”, não é mesmo? Se era verdade ou não, aquela era a frase que cercava minha cabeça naquelas horas. E esperava que ela fosse mentira, pois me sentia interessada.
Poderia abraçá-la para sempre, mas ela saíra sem mesmo se despedir de mim como eu esperava. E no meu mundo, as coisas giravam tristes e um filme das coisas que passamos juntos cruzou meus olhos fechados. Quis me acalmar e chorar, estava de novo deixando algo perdido no meio do caminho. Não queria me enganar mais, estava certo do que eu queria. Eu a queria. Não esquecê-la ou deixar de lembrar seus olhos ingênuos nem por um segundo. Estava decidido: queria me casar, ter filhos, olhar seu sorriso todos os dias de manha.
Eu queria amá-la.