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domingo, 25 de abril de 2010

Segunda Notificação

Caros leitores,

Desculpem-me, porém não consegui finalizar a historia em apenas 3 capítulos. Temo que necessite mais uns dois para terminá-la, pois cometi grande audácia em pré-determinar o tamanho deste texto. Perdoem-me também em não poder desenvolvê-lo de maneira mais satisfatória, porém não sou uma escritora tão digna de criatividade assim. Espero que estejam gostando, mais capítulos virão por ai.

Atenciosamente,
Camila Tucci

À direção.

Capitulo Três - Tirando Uma Casquinha

Rio de Janeiro, 7 de julho de 1990, Sábado.
Querido diário,
Faz mais de um ano que não a vejo passar. Ainda me sinto como se fosse esbarrar com ela a cada esquina que viro. Sinto falta de uma verdade, é como se a vida tivesse perdido o sentido. E hoje, ela faz menos ainda. Acabo de perder um ídolo e uma inspiração. Alguém que com suas músicas me fez perceber que somos todos canalhas e não prestamos. Aprendi que sou uma daquelas pessoas que “não muda quando é lua cheia, que não sabe amar”.
“Lhes de grandeza e um pouco de coragem”.
Viva Cazuza, eternamente.
22:49



Minha bolsa abarrotada de coisas inúteis me impediu de achar logo a chave de casa. Demorei pelo menos 10 minutos para encontrar e só consegui depois de despejar tudo no chão do corredor. Eu só tinha duas horas pra me arrumar para o encontro que conseguira arranjar com o Michel. “Dr. Michel”, ri sozinha. Era extremamente estranho pensar que aquele moleque que eu conheci, hoje é próspero em um trabalho tão nobre. Olhe pra mim. O que eu tenho a oferecer? Não sou linda. Pelo contrario, sou extremamente comum. Minha presença não é notada até eu esbarrar – com meu jeito atrapalhado – em alguma coisa que quebra. Meu sorriso não impede ninguém de chorar e eu sou tão ruim com as palavras! Meu suspiro não arranca outro. Não tenho o corpo que todos desejam ter. Mal tenho um emprego. Por outro lado, ele tem tanto... Pelo simples fato dele não precisar ter nada para ser especial. Ele simplesmente é.
Desabotoei a blusa e a pendurei na cadeira do quarto. Estava inteiramente perturbado. Vasculhei cada centímetro de minha casa, mesmo sabendo que tinha pouco tempo até encontrá-la em um bar. No meu armário, numa prateleira esquecida, uma caixinha de madeira parecia chamar mais a minha atenção que os outros cacarecos que ali estavam. Ela era toda rabiscada com símbolos que não faziam sentido e um “não abra nem em casos urgentes” num garrancho adolescente. Sentei-me no sofá e abri. Havia fotos realmente antigas. Júlia mudara muito de anos pra cá, mas nunca perdera seu jeito charmoso de ser. Tudo que ela fazia, parecia ter tanto amor envolvido. Então como eu pude esquecer – não completamente – como era o formato de seu rosto? Havia um bilhete meio amassado, com partes queimadas, onde eu só consegui ler o seguinte trecho:
“ Te amo tanto. É tão difícil pra mim ficar sem seu toque. É tão triste ter que dormir quando você não está por perto. É tão impossível imaginar minha vida sem você. E, Michel, acredite, eu vou continuar te amando hoje a noite, amanhã, terça-feira que vem, mês que vem, ano que vem, até daqui a 20 anos, até a eternidade.
Feliz 3 anos. Seu presente está aqui em casa. Venha buscá-lo junto com a sua camisa do Johnny Cash.
Beijos, Julia. 16.08.1988 “
Faltavam trinta minutos para encontrar-me com ele no tal bar e restaurante. Estava quase pronta e resolvi calçar logo meu salto alto, até porque gostaria de ficar com uma altura próxima a dele. Esvaziei um pouco minha bolsa, colocando somente o necessário, como não fazia há anos. Desci as escadas do prédio e entrei no carro. Michel marcara um encontro num bar que costumávamos ir quando éramos jovens, no qual eu já não me via freqüentando mais. Apertei o botão da garagem – graças a Deus agora ele funcionava – e dirigi cautelosamente até o lugar.
Fechei a caixinha, deixando uma lagrima cair. Será que eu fizera mesmo questão de apagar aquelas coisas da minha cabeça, ou elas simplesmente foram se apagando sozinhas? Não me recordo da ultima vez que pensara nela a não ser nos últimos 2 dias. Vesti-me rapidamente, colocando uma roupa um pouco social demais para a ocasião, sem saber mesmo porque queria parecer elegante perto dela. Ela parecia me conhecer muito melhor que eu mesmo, levando em consideração que ela se lembrava de uma parte da minha vida que eu mesmo não recordava. Pensei bem: eu sou aquilo que vivi. Se não me recordo o que vivi, talvez não recordasse também quem eu era. Deixei pra lá. Saí de casa, indo em direção ao antigo bar da Rua Maria Quitéria.
- A moça chegou cedo, hein.
- Acho que pra quem esperou tanto por isso, até que estou um pouco atrasada.
Tentei ser engraçada e honesta com meus sentimentos. Aquele lugar era estranho, a música parecia ser a mesma desde a hora em que cheguei. Adolescentes se embebedavam na porta e eu não parecia estar vestida de acordo com o lugar. A maioria deles usava uma calça apertada e um all star. Eu, por outro lado, estava com um vestido preto e um salto vermelho, e minha maquiagem era básica e não pesada como a deles.
Sentei-me e logo me encantei por aquela mulher. Pedi cerveja para nós dois e a conversa fluiu. Isso sempre acontece quando as pessoas estão levemente alteradas. Conversamos sobre as coisas que tínhamos passado naquela rua e muitas vezes caíamos nos risos. Falamos sobre nossa vida, nosso planos, nossa família, e de como tudo isso mudara drasticamente com o passar dos anos.
Ele sempre me parecia engraçado e espontâneo. Eu tive a impressão de que meus olhos estavam começando a ficar vesgos. Estava quase bêbada e isso me dava cada vez mais vontade de me aproximar dele. Uma vontade louca e inesperada de comer sorvete apareceu. Desejos de gente quase bêbada.
- Vamos comer sorvete? Eu estou morrendo de vontade de tomar sorvete!
- Claro! Garçom, por favor, traz o melhor sundae que você tem pra nós dois!
Caímos na gargalhada simplesmente por termos pedido sorvete. É estranho como a vida fica tão mais agitada e divertida quando se tem álcool. E isso é um típico pensamento de bêbado. No final, o sorvete tinha chegado e minha boca estava seca por um pouco dele.
- Eu adoro sundae. É uma das coisas mais gostosas que já comi. Eu nem estava pensando em comer, mas quando você disse sorvete, pensei logo em sundae.
- Para de falar coisas sem sentido e come!
Eu ri, e como era de costume, comi o sundae pelas beiradas. Percebi no rosto do Michel, ele parecia tão ingênuo enquanto deliciava-se na calda de chocolate. Tive uma vontade repentina de beijá-lo.
- Por que você esta comendo pelas beiradas?
- Porque a parte que eu mais gosto do sundae é a paçoca e eu quero deixá-la pro final.
Um silencio – de nós dois, não do local – tomou conta por um instante.
- É isso que a gente tá fazendo, não é?
- Como assim?
- Nosso relacionamento, Julia. A gente estava comendo pelas beiradas. E agora, estamos aqui, quase chegando à paçoca.
Meus olhos encheram d’água enquanto aquelas palavras saltavam da minha boca. Eu estava mesmo muito doido. E tudo o que havia se passado naquela noite, me deixara mais perturbado ainda. Quis abraçá-la, quis correr, me esconder, mas fiquei incrivelmente imóvel.
- Michel, essa é a coisa mais estúpida e linda que eu já ouvi em toda a minha vida. Mas eu espero que ainda demore a acabar o nosso sundae.


Mentira. Queria que tudo tivesse se concretizado naquele instante.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Capitulo Dois - Evidências

Rio de Janeiro, 16 de agosto de 1985, Domingo.
Querido diário,
Nem o fato de que o Brasil esteja sendo governado por um idiota chamado José Sarney, graças a morte inesperada do Tancredo Neves – que Deus o tenha – tirará de mim a felicidade que meu mundo se encontra. A partir de hoje, estou namorando e mais, pela primeira vez, completamente apaixonado. E só se sabe que está amando quando realmente se está. Não posso revelar meus mistérios. Me sinto completo e a parte que me faltava se chama Júlia.
19:02


Aquele homem tinha um rosto estranho. Seu cavanhaque era ruivo e ele, absolutamente careca. Um alargador preto enfeitava as duas orelhas e, no seu braço esquerdo, uma tatuagem estranha – e engraçada – da atriz Audrey Hepburn. Luz e ação. Começaria ali o meu teste para a peça “Muito Longe de Casa” baseada em um livro do próprio homem barbado. “Redentor” era como gostava de ser chamado. Ele fumou pelo menos 10 cigarros no período de 30 min.E aquilo me fez relembrar desse antigo vicio meu. Lembrei-me dos cabelos negros e lisos espetados e de quando me ofereceu um cigarro. Lembro-me de ter parado por saber que cada cigarro fumado o traria de volta ao meu pensamento. Aquele cheiro, aquela fumaça, aquele gosto e hoje, ele ali, do meu lado, comprando os mesmos cigarros de 20 anos atrás.
O movimento por ali era modesto, apesar de ser inicio de semana. Na minha sala mesmo, deviam ter entrado 4 pacientes e já estava quase na hora do almoço. Todo esse tempo ocioso me fez pensar na manhã que tivera antes de dar início a minha rotina de trabalho. São 12h, talvez encontrasse um amor perdido por aí. Pensei alto, minha sorte era que não tinha ninguém por perto para achar que sou maluco. E pra falar a verdade, nem sei porquê pensei. Talvez isso só me evidenciasse mais e mais que eu precisava mesmo tirar umas férias do hospital e pensar um pouco na minha vida. Eu me considerava um homem digno e bem apessoado, e não entendia como me considerava também muito solitário.
Recordei-me da sua barba espetando a minha bochecha e de como eu sentia cócegas. Seu hálito de cigarro que se confundia com meu de cerveja, e da maneira estranha que eu tanto o desejava. Não passei na prova do Redentor e não fui escolhida para fazer a maldita peça. Fiquei ansiosa e me deu vontade de comprar um cigarro. Cheguei a um barzinho perto de onde estava e fui ver se por ali vendia cigarros. Não vendia, mas pude desfrutar novamente daquele lindo tom de pele. Decidi me apresentar civilizadamente, mesmo morrendo de medo.
- Oi, você que é o Dr. Michel que estava hoje de manhã na banca de jornal, não é?
Eu estava mesmo distraído, olhando fixamente para o meu macarrão a bolonhesa e uma voz suave me perguntou quem eu era. Olhei os olhos amendoados e quase cor de mel que apareceram na minha frente. E a saia de cintura alta que favorecia seus seios. E tudo aquilo que apareceu que eu não conseguia verbalizar. Só sei que estávamos ali, um perto do outro, no momento mais íntimo que tivemos.
- Sim, sou eu sim! Bom, Michel, prazer, qual seu nome?
- Julia. Sabe que estou com uma dor nas costas? Passei aqui para comprar um cigarro e não tinha. Resolvi falar com você por saber que é medico.
- Pra falar a verdade, eu sou cardiologista. Cuido de corações.
- Ah, uma pena...
Eu me sentei mesmo sem ser convidada e ele não me pareceu desconfortável com isso. Será que ele não se lembra mesmo de mim? Será que existiram tantos amores depois do meu, que eu acabei me tornando irrelevante em sua vida? Será que ele nunca mais pensou em mim, depois que abandonei - quase que de vez – a cidade? Você agiu exatamente como achei que você fosse. Eu fui a machucada, por isso que me lembro tanto. Quanto mais pensava que tinha esquecido, mais eu estava lembrando que você existiu. E eu sei, existem coisas que realmente não fazem sentido.
Ela se sentou e eu não sei por que aquilo me causou um frio na barriga. Pude sentir meus lábios tremerem de tanta vontade de beijá-la. Quando ela começou a falar que havia pensado em fazer medicina e outras coisas que não fiz questão de ouvir, percebi que aquela mulher, que estava bem a minha frente, era a coisa mais linda que eu já vira. Não consegui terminar meu prato, pois nunca me senti a vontade comendo perto de alguém.
Quem diria que agora, 20 anos depois de ter quebrado o meu coração, ele vive para consertá-los por aí. Falei de muitas coisas com ele, mas ele não me pareceu muito interessado. Em suas 3 garfadas no macarrão que pedira, me recordei de como eu odiava o fato dele não saber segurar um talher. Ou por não saber que o guardanapo deveria ficar no colo. E de como esse jeito desajeitado dele continuava me perturbando. E, meu Deus, eu estava mesmo perturbada.
- Será que agora a gente pode para de fingir que não nos conhecemos?
- Como assim?
- Júlia, Michel! Eu sou a Júlia! A garota que você namorou dos seus quatorze até os seus malditos dezenove anos! A menina inocente que perdeu a virgindade com você. A idiota, que te contou pela primeira vez a piada estúpida do pássaro que não tinha cu! A Júlia que te amou louca, perdida e desesperadamente! A imbecil que deixou a vida dela correr sem rumo por nunca ter superado estar sem você. E, quando eu finalmente consegui esquecer o jeito que a sua barba espeta, que você come, que você ronca, que você respira, que você beija, que você sorri, que você olha, que você transa... te encontro, na rua, por acaso. E você não se deu nem o trabalho de colocar essa sua cabeça genial pra lembrar-se de como é a porra do meu rosto?
- Eu, na verdade, nem sei o que dizer. Realmente, não te reconheci. Pra mim, foi tão difícil quanto pra você, Julia! Eu demorei muito pra te esquecer e tive vários relacionamentos. Me dei muito mal em todos, sofri exatamente o que você sofreu. Mas, Julia, não fique brava comigo. Você me obrigou a te esquecer. Você sumiu, não disse pra onde iria, não me deixou nem se quer um bilhete ou uma blusa sua suja na qual eu pudesse apreciar o seu cheiro por mais algumas horas. Você não me deixou nada, nem alternativas. Tive que seguir em frente, mesmo não inteiramente satisfeito.
Respirei. De uma coisa eu tinha me esquecido: como suas palavras sempre soavam muito sinceras.
Parei. De uma coisa eu nunca poderia esquecer: eu me apaixonaria, se a visse de novo. E, que desta vez, seria impossível esquecê-la.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Capitulo Um - A Menina do Outro Lado da Rua

Rio de Janeiro, 5 de fevereiro de 1989, Domingo.

Querido diário,
Eu traí. Deixei todo um sentimento de lado, 4 anos e meio e outras coisas irem embora, em uma só noite. Desperdicei. Deixei fugir. Tudo escrito aqui até então, se foi. O vento secou, o tempo morreu pra mim, não existe vida após isso. Ela se foi, pra sempre, levando junto a si parte de mim. Arrumou as malas, saiu da cidade e nem esperou eu terminar de me esclarecer. Parece que não adormeço há dias. Quero recuar no tempo. Eu a quero de volta.
15:32





O pandemônio ensurdecedor do meu despertador me acordou às 8h, lembrando-me que hoje é segunda-feira. Esfreguei meus olhos remelentos com as mãos fechadas, para que minha visão voltasse ao normal. Espreguicei-me, estralando todos os ossos do meu corpo. Retirei o cobertor, me sentei e ali fiquei durante dois minutos. Eu estava realmente exausto. Beber com os amigos domingo, não é uma das melhores alternativas quando se sabe que vai acordar cedo – e para ralar num hospital - no dia seguinte. Tomei uma ducha, unicamente para despertar e, ao sair do Box, fiz a barba deixando-a bem curta – já que o barbeador parou de funcionar ainda quando estava aparando-a, me impedido de terminar o serviço - e com uma aparência saudável, diferente de como estava antes. Fui até a cozinha e enquanto a água do café não borbulhava, aprontei um sanduiche de presunto extremamente mal-feito. Bebi o café ardente e como de costume, queimei o céu da boca. Para suavizar, comi o sanduiche e bebi uma água bem refrescante. Vesti-me rapidamente, escovei os dentes e desci até a garagem. Liguei o carro e me lembrei de que meus cigarros haviam acabado. Decidi ir mesmo assim até o hospital e comprar por ali mesmo.
Merda, merda, merda! Acordei às 8h e 24min completamente desesperada. Havia esquecido mesmo de que tinha uma entrevista importantíssima marcada as 10h, e que não poderia aparecer por lá com um aspecto dorminhoco e desleixado como era de praxe. Vesti-me em um segundo e desci as escadas do prédio – já que morava num prédio de 3 andares antigo, no qual a eletricidade tinha sido descoberta a pouco – e entrei no meu Fiat velho. Apertei quinhentas vezes o botão da garagem, mas aquela merda estava com a pilha fraca. Chamei o porteiro 4 vezes e ele nem se quer apareceu. Tentei mais uma única vez – já estava pensando em pegar um taxi – mas ele veio correndo e abotoando as calças.
- Calma, Dona Júlia, já abrirei o portão para a senhora.
Acelerei tão pesadamente o carro, que ele até chiou. Minha entrevista de artes cênicas com um homem - que não era muito mais velho que eu - seria ao lado de um hospital público, que agora não me recordo bem o nome. Parei em uma banca de jornal a fim de comprar as pilhas para a porra do meu controle da garagem.
Uma mulher, que deveria ter lá seus 30 anos, cruzou a rua e eu podia jurar que vinha em minha direção. Seus cabelos louros sacudiam com brisa e eu podia quase senti-los batendo, esfriando e arrepiando sua nuca. No meio de toda distração que ela me causou, lembrei-me de precisava comprar além maldito cigarro, pilhas para o meu fiel barbeador Sony.
Estava atrapalhada, revirando notas de 2 reais espalhadas na minha bolsa. Quanto custa uma pilha palito? Eram 8h e 47min, me acalmei. Não estava tão atrasada como suspeitava. Não sei por que, mas minha carteira se resumia em bagunça. Eu nunca fui mesmo muito organizada...
Seu Manoel me saudou sorridente, como se já fosse sexta-feira.
- Dr. Michel, vai querer o de sempre?
Antes que eu pudesse respondê-lo, chegou as minha narinas aguçadas um cheiro suave e doce, que me tocou de certa forma.
- Bom dia, Sr. – disse a mulher que eu já havia paquerado de longe minutos atrás.
- Sim, Carlton vermelho, por favor. – falei rapidamente.
Aproximei-me de – algo que se parecia com – uma banca de jornal. E decidi comprar ali mesmo as pilhas para o controle da garagem. Ninguém merecia depender da boa vontade do meu porteiro Zé para chegar a tempo em algum compromisso todo dia.
- Bom dia, Sr. – saudei o vendedor, ainda revirando a bolsa.
De repente uma voz grossa, com um timbre fascinante, ecoou no meu ouvido direito, pedindo por cigarros de filtro branco. Lembro-me da época em que eu fumava e lembro-me de como demorou abandonar este vício.
- O Sr. tem pilhas do tipo AAA? – Nós dois perguntamos juntos, no mesmíssimo tom de voz.
Eu parei e dei uma risada. Na verdade eu não tinha achado graça alguma de nada por ali. Ri mesmo por estar nervoso, como sempre fico ao lado de uma mulher bonita como aquela. Bonita, não. Ela era linda.
- Devo me desculpar, mas só tenho esta única embalagem de pilhas AAA. Chegará mais amanhã.
- Então, por favor, venda a esta moça.
- Júlia, por favor.
- Venda a Júlia, Seu Manoel, minha máquina de barbear pode esperar até amanhã.
Ele se virou e entregou em minhas mãos a embalagem das pilhas AAA. Encostei por acaso em sua mão quente e me subiu um calafrio. Naquele momento, naquele exato momento olhei para seus olhos acinzentados que me engoliam, e me dei conta em um segundo : Ele era o Michel.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Notificação

Caros leitores,

Ficarei um tempo sem divulgar textos. A história que vem a seguir é extensa e será dividida em 3 capítulos, porém não muito grandes. Esta história tanto demandará de mim paciência e dedicação para escrevê-la, como em breve exigirá de vocês, para entendê-la.
Recomendo-os, que durante este tempo freqüentem outros grandes blogs e leiam ótimas histórias que eles apresentam. Ou que leiam um bom livro. Ou que simplesmente estudem pra prova de física.

Abraço,
Camila Tucci

À direção.

Cansei de falar sobre isso.

É arriscado pra mim, ter que abrigar isso. Não consigo mais observar fotos ou ler qualquer porção de papel pisado por ai. Queria abolir. Esquecer de vez que eu sofri por isso. Esquecer seu cheiro, seu gosto... e até sua habilidade de ser. É impraticável esquecer como você sorri. Ou como você bebe água nesse canudo que eu tanto tenho ciúme. Já tanto faz, pra você.
Você me esqueceu, assim como se esquece o nome de alguém se acabou de conhecer. Um alheio. Mas uma coisa eu sei: eu faria qualquer coisa pra apagar você. Mas será que eu quero mesmo? Talvez eu nunca mais encontrarei alguém que faça eu sentir o que você me apropriou... Eu inutilizei tudo. Eu fiz tudo tomar um rumo inconveniente, consegui arrasar meu próprio destino. Ridicularizei o mundo, como alguém que não sabe o que é vida. E eu não sabia mesmo. Quis pagar para ver. Quis apostar.







Prometo que o meu próximo texto será sobre assuntos mais compreensíveis.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Desconserto

Minha existência, minha astúcia, minha não esperteza. Eu. Desafiei-me. Agora...bem, agora eu sinto como se estivesse dormente.Eu não sinto nada. Como se eu não contrariasse os meus chamados. Falecida, por dentro. E por fora, aos poucos desconsertando.
Vocês estão arrastando o tempo.
Não só sentem e anseiem.
Assim nada nunca virá.
Aposte toda sua insegurança...
E tudo que há de ingênuo em você.
Grite por algo.
Alcance, se possível.
Eu sei que será.

Água Mole & Pedra Dura

Eu nunca vou me esquecer. A ausência de um pedaço desta historia não tem como destruir o que sobrou. Estou esperando nessa mesma pedra que um dia a gente parou. As recordações estão me enlouquecendo e estou inteiramente sem oxigênio. Vem-me frutos de coisas banais e de momentos triviais. Tenho mesmo que esquecer... e sei disso. Vai ver é isso que vem me diminuindo e me fazendo pensar em saltar no amplo mar que assisto. A água reflete meus olhos entediados e consternados. Minhas lágrimas se juntam ao mar como minha existência por acaso se juntou um dia a sua, em alguma parte desse romance.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Malditas Mini-saias

Um dia me falaram algo que refletiu durante muito tempo dentro da minha cabeça. “Escritores não são aqueles que falam de amor. Escritores são aqueles hábeis a escrever sobre qualquer coisa. Sobre mini-saias, por exemplo. Quero assistir você fazer um texto respeitável sobre mini-saias”. Eu não soube fazer e pra falar a verdade, eu nem se quer realmente tentei. Achei que escritores narrassem cenários, episódios, amarguras, receios e enfim, o amor. Mas me contaram que não. E sabe o que eu acho sobre isso? Não quero regras pra escrever, pra desabafar. Eu não quero ser uma escritora.
Não quero abafar o hábito de completar sempre um texto, assim, falando de uma das únicas coisas que nós, criaturas superdesenvolvidas e inteligentes, não conseguimos entender, o amor.
Deixo para os grandes escritores o encargo de escrever sobre mini-saias. E tenho dito.









Dedicado a autora da frase : Maria Eduarda Araújo.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Psicanalisando

Fazia frio, bastante frio, mas não daqueles de fazer congelar os dedos dos pés. Não chovia, nem tinham raios talhando o céu. Era um dia ordinário, sem muitas aventuras, como era de se aguardar. Menos pelo fato de que seria o dia da minha primeira consulta como o meu novo – e terceiro – psicólogo. Ao chegar à porta do tal consultório, toquei a campainha e protegi minha mão fria e úmida no bolso a fim de aquecê-la. Atendeu-me um senhor, bem velhinho, segurando uma bengala de madeira.
- Aqui é consultório do Dr. Alexandre?
- Não. Aqui é a residência do Sr. Vicente e você acaba de atrapalhar o sono dele.
E a porta se fechou e minha expressão também. O consultório era na porta ao lado, percebi isso depois que colocar os óculos e descobrir que o me parecia um 2, na verdade era um 3. Pronto, 153, não tem erro. E lá estava o Dr. Alexandre, abrindo a porta, me olhando com um sorriso bucólico. Ele era alto, seu cabelo era grisalho e estava totalmente em forma para sua idade. Usava uma roupa nem casual, nem formal. A verdade é que não parecia bem um analista e sim, um empresário.
- Carlos, certo? Entre, por favor.
- Sim, obrigado.
Seu consultório tinha uma iluminação perfeita. A luz era fraca e confortável para os olhos de qualquer um. Com um gesto gentil ele apontou para um sofá estilo Luis XV no meio da sala e pediu para que eu me deitasse. O sofá bege se posicionava de maneira em que eu não pudesse ver a grande poltrona de couro que ele em instantes se sentaria, logo atrás de mim. Na minha frente, uma parede inteira de vidro dava para uma vista privilegiada da paisagem invejável do Rio de Janeiro.
- E então, o que te traz aqui, rapaz?
De fato, não era uma pergunta complicada. É muito fácil para alguém dizer o que te traz a algum lugar. Não era pra mim. Precisei me concentrar para não engasgar nas palavras.
- Acho que sou louco, ou quem sabe tenho só um distúrbio psicológico.
Ele riu. Talvez assim como pra mim aquelas palavras soaram cuspidas, pra ele também. Ele se levantou. Sem que eu tivesse percebido de cara, me deu um copo d’água e uma caixinha com lençinhos de papel. Estranhei. Será que todo mundo vem aqui pra se lamentar da vida medíocre que leva? Não quero ser só mais um nesse consultório. Temo que eu não possa controlar isso. Assim como nada na minha vida insignificante. Medíocre.
- Fugi de casa há quatro dias, estou morando com um amigo. Meus pais aparentemente me odeiam. Transei com a minha professora de geografia na sala da diretora. Sou péssimo em Matemática. Odeio crianças. De verdade, odeio o jeito que elas andam tropeçando em si mesmas e quando babam nos seus brinquedos. E, por outro lado, acho que ter filhos é o que eu mais quero na minha vida. Você acredita, que ela ama outra pessoa? Consegue imaginar a única pessoa que extrai seu ar, faz seu coração ferver, seu corpo contrair, suas mãos transpirarem e estremecerem só por estar se aproximando? Ela ama outra pessoa...
Respirei fundo, tirei um lenço. Não estava chorando, mas algumas lagrimas pesadas caíram sem querer. Não me lembrava mais que havia alguém atrás de mim, era impossível não notar a presença de alguém naquela sala, mas eu não notei.
- Eu nunca ganhei um campeonato de futebol, nem nunca soube tocar nenhum instrumento. Nunca fui bom em nenhum jogo de videogame e sempre odiei comer cenouras e beterrabas. Não aprendi a andar de bicicleta com o meu avô. Eu nunca nem ouvi a voz dele. Não sou bonito e não canto bem. Eu sei lá... eu sou desastre. Não faço nada direito!
- Carlos, você não precisa ser um rockstar nem um jogador de futebol para ser normal. Muito menos comer legumes. E, combinemos, transar com a professora e sair de casa são coisas que todos querem fazer na sua idade, apenas não tem audácia ou destreza para isso. Você chora e isso já te faz um homem bonito. Querer ter filhos é natural, mas não precisa ser com o seu primeiro amor. Amores vêm e vão, apenas o que resta são as experiências que eles dão. Sofrer, sentir dor, choramingar, é coisa do ser humano. Somos teatrais e fantasiosos, a única diferença é que uns demonstram muito seus sentimentos e outros escondem, por vergonha. Amar e chorar por amor não é pecado algum, é uma dádiva. São poucos que amam legitimamente. A maioria só pensa estar amando. Ela não ama outra pessoa, ela está com outra pessoa. E sabe o que se leva disso tudo? Eu não sei. Porque há coisas que te ajudam a crescer e outras que só servem pra ilustrar a vida. Então, Carlos, viva.